O que para você é lixo eletrônico pode ser a
única maneira que uma criança ou jovem de uma comunidade carente tenha para
aprender a utilizar um computador. (Imagem: Marcos Santos /USP Imagens).
Destinos diferentes
Responda rápido: quantos computadores e
impressoras você teve até hoje? E aparelhos de telefone celular?
Na Era Digital, com o rápido avanço da
tecnologia e o crescente aumento do consumo, é raro encontrar alguém que não
queira ter o último modelo de celular ou o computador mais moderno.
Porém, quando você decide trocar o seu
aparelho eletrônico, vê apenas a possibilidade de se livrar de uma
"sucata", ou melhor, de um "lixo tecnológico".
Afinal, aquele computador que você comprou
na segunda metade da década passada, com um "moderno" leitor de
CD/DVD, não passa de sucata perto dos atuais modelos "Tudo em Um".
Nada contra você querer atualizar os seus
equipamentos, muito pelo contrário.
Mas existem alguns dados importantes sobre o
assunto: um deles é que equipamentos eletrônicos, como computadores,
impressoras, carregadores de celular, pilhas e baterias que você descarta, têm,
em sua composição, dezenas de substâncias que podem contaminar as outras
pessoas, os animais e o meio ambiente, como metais pesados (chumbo, cádmio,
mercúrio) e outros elementos tóxicos.
Por isso, o descarte deve ser feito de
maneira adequada e nunca no lixo comum.
É provável também que você nunca tenha
pensado que o seu lixo eletrônico pode se transformar em uma grande
oportunidade de crescimento para outras pessoas, caso passe por uma reforma. E
que talvez esta seja a única maneira que uma criança ou jovem de uma comunidade
carente tenha para aprender a utilizar um computador.
Monitores exigem cuidados especiais devido a
presença de chumbo e fósforo. (Imagem: Marcos Santos/USP)
Do lixo eletrônico aos recursos
Mas o mais importante nesta história é que
você não está sozinho: assim como você, milhões de pessoas em todo o mundo
estão fazendo a mesma coisa: trocando suas "sucatas" eletrônicas por
aparelhos mais modernos.
O resultado disso é assustador: a geração
global de lixo eletrônico cresce cerca de 40 milhões de toneladas por ano, de
acordo com o relatório Recycling - from e-waste to resources (Reciclando
- do lixo eletrônico aos recursos) publicado pelo Programa das Nações Unidas
para o Meio Ambiente (PNUMA). Segundo o documento, o Brasil descarta 96,8 mil
toneladas de computadores por ano.
O relatório analisa a situação do lixo
eletrônico na África do Sul, Quênia, Uganda, Marrocos, Senegal, Peru, Colômbia,
México, Brasil, Índia e China.
De acordo com o documento do PNUMA, os
aparelhos eletrônicos possuem placas com circuitos eletrônicos que podem chegar
a utilizar mais de 60 tipos de elementos químicos.
O crescimento do consumo no setor aumentou a
utilização de recursos naturais para suprir esta necessidade e isto está
levando a escassez destes recursos.
Por outro lado, o descarte inadequado de
aparelhos obsoletos contamina o meio ambiente, pois estes elementos químicos ou
são valiosos ou são tóxicos, ou ambos. As atividades de mineração consomem
altas taxas de combustível, com alta geração de CO2, contribuindo negativamente
para o efeito estufa.
Portanto, o mais sensato seria recuperar os
metais utilizados nos aparelhos descartados do que produzir novos metais, ou
seja, "minerar" o lixo eletrônico: uma tonelada de telefone celular
sem bateria contém 3,5 quilos de prata, 340 gramas de ouro, 140 gramas de
paládio e 130 quilos de cobre. Segundo o relatório, em 2007, mais de 1 bilhão
de celulares foram vendidos em todo o mundo, um aumento de 896 milhões em
comparação a 2006.
Especialistas no setor apontam que em 1
tonelada de PCs existe mais ouro do que em 17 toneladas de minério bruto do
metal. Por isso, é fundamental que a sociedade se mobilize para encontrar
alternativas para lidar com essa realidade.
Projetos sociais recebem computadores
reciclados por meio de empréstimo. (Imagem: Marcos Santos /USP Imagens).
Alternativas viáveis
Um exemplo de trabalho na área está sendo
realizado pelo Centro de Descarte e Reúso de Resíduos de Informática (CEDIR)
da Universidade de São Paulo (USP), um projeto pioneiro no setor público iniciado
em dezembro de 2009 e que se tornou uma referência nacional no tratamento
adequado de resíduos eletrônicos.
Em um galpão de cerca de 400 metros
quadrados, localizado no campus da Cidade Universitária, em São Paulo, o CEDIR
recebe CPUs, monitores, teclados, mouses, estabilizadores, no-breaks,
impressoras, telefones, celulares, fios e cabos, CDs, DVDs e pequenos objetos
como câmeras fotográficas, pilhas, baterias e cartuchos descartados pela
comunidade. Mas nem pense em levar a sua geladeira velha: eles não recebem
eletrodomésticos.
Os equipamentos que ainda têm condições de
serem reaproveitados passam por uma reforma e são encaminhados para projetos
sociais cadastrados sob a forma de empréstimo, ou seja, serão devolvidos ao
CEDIR no fim de sua vida útil.
Os equipamentos que não podem ser
reaproveitados são desmontados, e as peças ou são separadas e encaminhadas para
recicladores, ou são utilizadas como reposição para outras máquinas.
Desde a sua inauguração, mais de 600
equipamentos, entre computadores e impressoras, já foram cedidos tanto para
unidades da USP como também para entidades sociais cadastradas.
Treinamento na USP: gerando renda para
catadores e protegendo meio ambiente. (Imagem: Marcos Santos/USP)
Inclusão digital e geração de renda
Uma das entidades contempladas foi o Clube
de Mães Novo Recreio, na periferia de Guarulhos, na região metropolitana de São
Paulo.
Desde 2010, graças aos 20 computadores
recebidos via empréstimo do CEDIR, crianças, jovens e adultos da comunidade
passaram a ter aulas de informática, levando a inclusão digital a um lugar onde
o asfalto ainda não chegou.
Outra vertente do trabalho é a capacitação
de catadores de material reciclado. Em 2010, o CEDIR e o Instituto Gea Ética e
Meio Ambiente foram contemplados por um projeto da Petrobras que está
possibilitando o treinamento de catadores para a reciclagem correta de
eletrônicos.
Especialistas da área contam que, para
desmontar monitores e televisores de tubo, muitos catadores simplesmente dão
marretadas no equipamento. O problema é que, fazendo isso, o chumbo e o fósforo
que compõem esses equipamentos são liberados, contaminando o ambiente e as
pessoas. O curso visa a capacitação de catadores para lidarem com lixo
eletrônico sem prejudicar a si mesmos ou a natureza.
Valéria Dias - Agência USP
Nenhum comentário:
Postar um comentário