Professora americana que estudou o assunto
afirma que obras sobre jogos eletrônicos podem transformar alunos relutantes em
leitores ávidos
“No momento em os estudantes foram
apresentados aos livros inspirados em games, houve uma mudança na percepção
deles sobre literatura. Ler não era mais uma tarefa obrigatória, mas sim
divertida.”
A professora e pesquisadora americana
Kristie Jolley, de 30 anos, é uma entusiasta dos livros baseados em games. Em
um estudo publicado nos Estados Unidos em 2008, ela mostrou como essas obras
podem despertar o interesse de pré-adolescentes pela literatura de forma geral.
A pesquisa foi feita com 250 estudantes com idades entre 13 e 14 anos da
Springville Junior High School, em Springville, no estado americano de Utah.
Segundo Kristie, oferecer aos jovens obras sobre um assunto familiar é o
caminho certo para cativar futuros leitores. VEJA.com conversou com a
professora por e-mail. Confira a entrevista a seguir:
Por que a senhora decidiu explorar o
potencial dos livros baseados em games em suas aulas? Eu já dei aulas para
alunos pouco habituados à prática da leitura e outros relutantes. Sempre soube
o quão importante é para eles ler textos sobre assuntos que lhes sejam
familiares. Utilizar um conhecimento pré-adquirido é a chave para a compreensão
de um texto. Na época do meu estudo, muitos alunos estavam jogando Halo, da
Bungie. As crianças amavam esse game e falavam sobre ele o tempo todo. Foi
natural começar a pesquisar maneiras de envolver aspectos da vida dos alunos em
uma rotina de leitura. Pesquisei e encontrei uma série de três livros baseados
em Halo. Isso coincidiu com o fato de os alunos pedirem para ler textos
baseados em games.
Como a senhora escolheu os melhores livros
para as aulas? Meus estudantes estavam jogando títulos que possuíam
versões literárias e sugeriram a inclusão dessas obras na nossa biblioteca da
sala de aula. Também contei com a colaboração de um colega para encontrar
outros textos baseados em games. Pedi algumas referências a professores de uma
universidade local especializados em literatura juvenil. Conversei com os pais
de cada aluno para explicar a razão pela qual estava utilizando esse tipo de
material e pedir a autorização deles para indicar essas obras a seus filhos.
O que os outros professores acharam da sua
iniciativa? Uma amiga também professora me apoiou muito. Ela me ajudou a
obter recursos para a compra de novos livros para a biblioteca da escola
pública e também me auxiliou a nutrir o interesse dos alunos pelos livros
baseados em games, já que esse tipo de material é raro nas bibliotecas
públicas. Sempre estávamos à disposição para ajudar esses estudantes.
Descobrimos também que essa é uma boa ferramenta para que alunos que têm o
inglês como segunda língua se familiarizem com o novo idioma. Esses alunos
carregavam uma bagagem sobre o game: ler uma história baseada na história os
ajudava a ampliar o vocabulário.
Segundo seu estudo, qual o potencial dos
livros baseados em games? A conclusão dessa pesquisa reforça a constatação
de que estudantes são bem sucedidos quando se sentem confiantes. Quando comecei
a avaliar os livros baseados em jogos estava ciente de que encontraria um nicho
de alunos que poderia se interessar por essas obras mesmo sem saber da
existência delas. No momento em que foram apresentados aos livros, houve uma
mudança na percepção deles sobre literatura. Ler não era mais uma tarefa
obrigatória, mas sim divertida. Assim, esses livros são uma espécie de retrato
do interesse dos estudantes. Quando uma criança pega um livro por iniciativa
própria e se diverte com ele, uma porta é aberta para que ela escolha outro e
se torne um leitor independente.
Como outros professores podem usar esses
livros em sala de aula? Usei esses livros como ponto de partida. Quando
percebia que havia um aluno desinteressado ou relutante em ler qualquer coisa,
mas que gostava de videogames, eu o apresentava a uma das obras sobre jogos. Um
professor deve conhecer seus alunos individualmente antes de sugerir uma
leitura. Eu conhecia os meus. Sabia que esse tipo de livro poderia abrir
portas. Porém, se um professor apenas recomenda a leitura e, em seguida, se
acomoda, não está executando bem seu trabalho. O próximo passo é ajudar os
estudantes a enxergar adiante. Se um livro do gênero explora a sobrevivência e
a bravura, deve-se em seguida recomendar uma obra que aborde esses temas. O
professor deve se comunicar com o aluno para entender a variedade de textos que
pode lhe recomendar, a fim de transformá-lo em um leitor confiante a ponto de
buscar seus próprios textos. Isso fará com que ele se transforme em um leitor e
aprendiz ao longo de toda a vida.
A senhora continua usando esses livros em
classe? A idade dos meus alunos mudou. Ao invés de ensinar adolescentes,
hoje trabalho com crianças mais jovens. Nesse caso, não é apropriado sugerir
esse tipo de leitura. De qualquer forma, sempre vou sugerir livros para meus
estudantes com base em seus interesses. Conhecer um assunto é imprescindível
para a compreensão de um texto. Se meus alunos estiverem interessados em
pássaros, vou lhes oferecer textos que explorem o assunto: só assim,
constrói-se uma relação de confiança que me possibilita indicar outras obras. A
chave é começar com o que os estudantes já conhecem e, então, construir algo a
partir dali.
A senhora joga videogames? Sim,
especialmente no iPhone. Gosto de puzzles como Tetris ou Dr. Mario. Se um dia
alguém escrever um livro baseado em Tetris, ficarei interessada em saber como a
questão do enredo será resolvida em um caso como esse.
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